بِسْمِ اللّٰهِ الرَّحْمٰنِ الرَّحِيْمِ
قُل أَعوذُ بِرَبِّ الفَلَقِ ﴿١﴾ مِن شَرِّ ما خَلَقَ ﴿٢﴾ وَمِن شَرِّ غاسِقٍ إِذا وَقَبَ ﴿٣﴾ وَمِن شَرِّ النَّفّٰثٰتِ فِى العُقَدِ ﴿٤﴾ وَمِن شَرِّ حاسِدٍ إِذا حَسَدَ ﴿٥﴾
Diga (Ó Muhammad (sallallahu alaihi wassallam)): Eu procuro refúgio no Rabb da manhã, contra o mal de tudo o que Ele criou, e do mal das trevas (da noite) quando a sua escuridão se espalha, e do mal daqueles que sopram nos nós (na hora de praticar feitiçaria), e do mal do invejoso quando inveja.
قُل أَعوذُ بِرَبِّ النّاسِ ﴿١﴾ مَلِكِ النّاسِ ﴿٢﴾ إِلٰهِ النّاسِ ﴿٣﴾ مِن شَرِّ الوَسواسِ الخَنّاسِ ﴿٤﴾ الَّذى يُوَسوِسُ فى صُدورِ النّاسِ ﴿٥﴾ مِنَ الجِنَّةِ وَالنّاسِ ﴿٦﴾
Diga (Ó Muhammad (sallallahu alaihi wasallam)): Eu procuro refúgio no Rabb dos humanos, o Rei dos humanos, o Deus dos humanos, contra o mal do murmurador que recua (quando o nome de Allah Ta’ala é mencionado), aquele que murmura nos corações dos humanos, (quer seja um) dos Jinns ou dos humanos.
Estes dois surates, Surah Falaq e Surah Náss, foram revelados em Madinah Munawwarah após o Hijrah de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam). Consequentemente, esses dois surates são chamados de “Madaní.”
A razão da revelação desses dois surates foi que Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) foi gravemente afetado por sihr (magia negra).
Magia Negra sendo feita para Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam)
No 6º ano após o Hijrah, Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e os Sahábah (radhiyallahu an’hum) viajaram para Makkah Mukarramah com a intenção de realizar o Umrah. No entanto, eles foram impedidos de entrar em Makkah Mukarramah pelos kuffár de Makkah. Consequentemente, um tratado de paz foi assinado por Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e os kuffár estipulando que durante dez anos não haveria guerra ou combates entre os dois exércitos. Este tratado foi denominado Sulh Hudaybiyyah (Tratado de Hudaybiyyah).
Depois do tratado ter sido assinado, Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e os Sahábah (radhiyallahu an’hum) regressaram a Madinah Munawwarah durante o mês de Zul Hijjah.
Um mês depois, no mês de Muharram do 7º ano após o Hijrah, um grupo de judeus vieram ao encontro de Labíd bin A’ssam, que era um especialista em magia negra e feitiçaria. Estes judeus disseram-lhe que tinham tentado incansavelmente, em muitas ocasiões, enfeitiçar Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e matá-lo, mas toda a magia negra e feitiçaria não foi eficaz. Por isso, decidiram abordá-lo, sabendo que ele era um especialista na área e que não existia pessoa tão proficiente quanto ele na arte da magia negra. Pagaram-lhe três dinares (moedas de ouro) para cumprir a tarefa de assassinar Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam).
De acordo com algumas narrações, Labíd era judeu, enquanto outras narrações indicam que ele era um munáfiq (hipócrita), e ainda outras narrações mostram que ele era dos Anssár de Madinah Munawwarah.
Háfiz Ibnul Hajar (rahimahullah) reconcilia essas narrações explicando que antes do Hijrah de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam), os Anssár tinham laços fortes com os judeus. No entanto, após o Hijrah de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) para Madinah Munawwarah, os Anssár abraçaram o Islám e cortaram os laços com os judeus. Entre eles estava Labíd bin A’ssam. Devido à sua forte relação com os judeus, alguns o consideravam judeu.
Labíd era da tribo Banu Zuraiq. Ele fingia ser um crente e participava nos ajuntamentos de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam), enquanto Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) sabia que ele pertencia aos munáfiquín (hipócritas).
Após Labíd aceitar o pagamento de três dinares dos judeus, ele entrou em contacto com um rapaz judeu que frequentava a casa de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e estava a seu serviço. Ele pediu ao menino que obtivesse para ele o cabelo abençoado de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam). Para fazer com que o menino lhe trouxesse o cabelo, ele inventou um falso pretexto que lhe explicou, convencendo-o que queria o cabelo para algum bom propósito. Assim, o rapaz pegou o cabelo abençoado e o pente de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e entregou-o a ele.
Labíd usou o cabelo abençoado de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam), os dentes do pente e o espádice masculino de uma tamareira no feitiço que fez para Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam). Outras narrações também explicam que ele fez uma imagem de cera de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e inseriu onze agulhas nela.
Toda a família de Labíd bin A’ssam praticavam a feitiçaria, por isso ele usou as suas filhas para ajudá-lo no processo de enfeitiçar a Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam). Depois de completar o sihr, Labíd pegou esses artigos e os colocou debaixo de uma pedra no fundo de um certo poço em Madinah Munawwarah chamado Bir Zi Arwán.
Hazrat Áishah (radhiyallahu an’ha) explica que depois do feitiço ter sido feito para Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam), ele adoeceu e começou a esquecer muitos assuntos mundanos. Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) esquecia de quem era a vez dentre as suas respeitadas esposas e ia para a casa da outra esposa. Ele também havia perdido o apetite e ficou fraco. No entanto, no que diz respeito aos assuntos de Díne, como transmitir o Díne ao Ummah, lembrar o wahí que lhe foi revelado, a magia negra não o afectou de forma alguma. Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) permaneceu neste estado de doença durante aproximadamente seis meses.
Quando Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) estava passando por essa dificuldade, ele de princípio sentiu que estava relacionado a alguma doença. Consequentemente, Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) foi submetido a ventosas (cupping) para se curar, mas quando viu que não havia melhoria na sua condição, percebeu que havia algo mais que o estava afectando.
A conversa entre dois anjos
Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) certa vez falou com Hazrat Áisha (radhiyallahu an’ha) durante a sua doença e disse a ela: “Estou doente há muito tempo e supliquei continuamente a Allah Ta’ala para me revelar a realidade da situação.
Enquanto eu estava deitado num estado entre o sono e acordado, Allah Ta’ala enviou dois anjos até mim (Hazrat Jibraíl (alaihis salám) e Hazrat Mikaíl (alaihis salám). Um sentou-se do lado da minha cabeça. e o outro do lado dos meus pés.
O anjo que estava do lado da cabeça perguntou ao anjo que estava nos pés: “Qual é o problema em relação a esta pessoa? De que doença ele está a sofrer?”
O outro respondeu: “Ele está sob influência de magia negra.”
O anjo do lado da cabeça perguntou ao anjo do lado dos pés: “Quem é o responsável por isso?” O outro anjo respondeu: “Labíd bin A’ssam.”
O anjo do lado da cabeça perguntou ao anjo do lado dos pés: “Quais artigos foram usados para fazer a magia negra sobre ele?”
O anjo respondeu: “A magia negra foi feita no seu cabelo, nos dentes do seu pente e no espádice masculino da tamareira.”
Depois de ouvir este diálogo que ocorreu entre os dois anjos (que na realidade era um meio para informar Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) da sua condição do lado de Allah Ta’ala), Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) acordou e instruiu um grupo de quatro Sahábah (Hazrat Ali, Ammár, Jubair ibn Iyáss e Qais ibn Mihsan (radhiyallahu an’hum)) para ir ao local onde o sihr (magia negra) foi colocado e removê-la.
Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) também foi informado por Allah Ta’ala no sonho que a magia negra foi colocada num certo poço. É relatado que Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) também foi ao poço e os artigos sobre os quais a magia negra foi feita foram removidos de baixo de uma pedra no fundo do poço e trazidos diante de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam).
Foi neste momento que Hazrat Jibraíl (alaihi salám) desceu dos céus e trouxe consigo estes dois surates, Surah Falaq e Surah Náss, que foram revelados sobre Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) naquela ocasião. Hazrat Jibraíl (alaihis salám) ordenou a Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) que recitasse cada versículo destes dois surates do início ao fim. À medida que Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) recitava cada versículo, um nó no intestino se abria e as agulhas da imagem de cera de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) eram removidas. Enquanto as agulhas eram removidas, Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) sentiu um pouco de dor, mas depois disso sentiu um imenso alívio.
Certos Ahádice mencionam que depois do sihr (magia negra) ter sido removida, Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) sentiu um alívio tão grande que foi como se ele finalmente tivesse sido libertado das algemas após ter sido amarrado por um longo período de tempo.
Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) descreveu as árvores e a água do poço para Hazrat Áishah (radhiyallahu an’ha) dizendo: “Era como se a água tivesse sido infundida com mendhi tornando-a extremamente escura, e as árvores que cresciam do poço pareciam com cabeças de demônios (alguns relatos mencionam que os galhos das árvores pareciam cabeças de cobras).” Este era o tipo de lugar assustador onde a magia negra foi feita sobre Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam).
Após Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) ter recitado o muawwazatain (Surah Falaq e Surah Náss), Hazrat Jibra’íl (alaihis salám) recitou o seguinte duá, a fim de tratar Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) da magia negra que o havia afligido:
بِاسْمِ اللهِ أَرْقِيْكَ مِنْ كُلِّ شَيْءٍ يُؤْذِيْكَ مِنْ شَرِّ كُلِّ نَفْسٍ أَوْ عَيْنٍ حَاسِدٍ اللهُ يَشْفِيْكَ بِاسْمِ اللهِ أَرْقِيْكَ
Em nome de Allah Ta’ala eu recito estas palavras sobre si (e trato a ti buscando a cura de Allah Ta’ala) de tudo que está prejudicando a si – do mal de cada alma ou olho invejoso. Que Allah Ta’ala lhe conceda a cura. Em nome de Allah Ta’ala eu recito estas palavras sobre si (e trato a ti buscando a cura de Allah Ta’ala).
O carácter impressionante de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam)
Depois da magia negra ter sido removida e Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) ter sentido uma grande sensação de alívio, Hazrat Áishah (radhiyallahu an’ha) sugeriu-lhe que chamasse as pessoas, expusesse a pessoa que fez o feitiço sobre ele e queimasse o sihr à vista do público. Algumas narrações mencionam que ela sugeriu a Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) banir esta pessoa (Labíd bin A’ssam) de Madinah Munawwarah.
No entanto, a resposta imediata de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) foi: “Ó Áishah! Allah Ta’ala me curou, portanto não há necessidade de eu fazer isso. O castigo que Allah Ta’ala irá infligir a ele é suficiente para ele.” Contudo, Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) ordenou que o poço fosse enterrado e completamente selado.
Era o abençoado hábito de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e uma manifestação do seu carácter elevado que ele nunca se vingou de qualquer acção feita contra si mesmo. Pelo contrário, ele sempre perdoou aqueles que o maltrataram ou até mesmo o oprimiram. Labíd bin A’ssam costumava a frequentar os majális (ajuntamentos) de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam), já que era um dos hipócritas, mas é mencionado que mesmo depois deste incidente ter ocorrido, Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) nunca se dirigiu a ele em relação a isso, nem o tratou de forma diferente.
O propósito da revelação destes dois surates
Estes dois Surates, como explicado anteriormente, foram revelados na ocasião em que a magia negra foi feita sobre Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam). Estes Surates foram revelados por Allah Ta’ala para a cura e proteção de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) em particular, e para a proteção do Ummah de Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) em geral.
Os Ulamá explicam que o primeiro Surah (Surah Falaq) foi revelado para proteger a pessoa de todas as maldades e perigos físicos em particular, e o segundo Surah (Surah Náss) foi revelado particularmente para proteger de todos as maldades e perigos espirituais.
قُل أَعوذُ بِرَبِّ الفَلَقِ ﴿١﴾
Diga (Ó Muhammad (sallallahu alaihi wassallam)): Eu procuro refúgio no Rabb da manhã.
Neste versículo, Allah Ta’ala mencionou especificamente a palavra ‘manhã’, indicando a hora do amanhecer, quando a luz é vista após a escuridão.
Nisto há uma mensagem para Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e o Ummah, informando-os que assim como a escuridão da noite é seguida pelo brilho do amanhecer, da mesma forma, após o período de sofrimento e dificuldade, a assistência de Allah Ta’ala certamente virá.
Uma vez que a assistência divina de Allah Ta’ala chega, ela dissipa todas as camadas de escuridão e faz com que a luz se espalhe por toda parte. Portanto, diante de problemas, sofrimentos e dificuldades, deve-se recorrer a Allah Ta’ala e não se deve perder a esperança na Sua misericórdia em nenhum momento.
Alguns Mufassirín explicam que a palavra “Falaq” se refere a um vale no Jahannam. A intensidade e ferocidade deste vale é tal que o próprio Jahannam busca refúgio do mesmo em Allah Ta’ala todos os dias. Pode-se muito bem imaginar a grave situação daqueles que serão atirados em tal lugar no Jahannam.
Portanto, por Allah Ta’ala ter mencionado este vale do Jahannam e mencionado que Ele é o Senhor deste vale, há uma indicação para este facto que quando Allah Ta’ala é o Criador da fonte de tal miséria, dor e sofrimento além do qual não se pode imaginar que nenhum problema e dificuldade seja pior do que isso, o homem deve perceber que não existe nenhum lugar de refúgio e santuário para ele além de recorrer a Allah Ta’ala. Somente Ele tem a solução para todos os problemas, as respostas para todas as perguntas e a saída para todas as dificuldades.
مِن شَرِّ ما خَلَقَ ﴿٢﴾
Contra o mal de tudo o que Ele criou
Este versículo inclui e abrange todo tipo de dificuldade ou mal que pode ser imaginado, bem como aquilo que não pode ser concebido humanamente. O refúgio é procurado em Allah Ta’ala de todo tipo de dano ou mal.
Neste versículo, Allah Ta’ala direciona a nossa atenção para Ele como sendo o Criador do mal. Portanto, quando ele é o Criador do mal, devemos procurar refúgio Nele para remover o mal. Por isso, quando pedimos refúgio, devemos pedir refúgio no Rabb do amanhecer contra o mal das Suas criaturas.
Nisto, Allah Ta’ala nos realça que quando tudo é Sua criação, não importa quão insignificante ou quão destrutivo o mal possa parecer aos nossos olhos, devemos lembrar que todos são Suas criaturas e Ele tem total controle sobre eles.
Portanto, não se deve ficar dominado pelo problema e pelas circunstâncias em que se encontra, mas sim olhar para o Ser que criou tudo e tem controle sobre tudo.
Em essência, o crente deve perceber que Aquele que tem o poder de criar uma coisa também tem o poder de destruí-la e levá-la ao oblívio total. Às vezes, uma pessoa fica tão consumida pelo problema que se encontra que acaba por esquecer que existe um Criador que tem controle total e supremo sobre tudo.
Depois de buscar refúgio em Allah Ta’ala contra todos os males de uma forma geral, Allah Ta’ala nos ensina a buscar refúgio Nele contra três males específicos nos seguintes três versículos:
وَمِن شَرِّ غاسِقٍ إِذا وَقَبَ ﴿٣﴾ وَمِن شَرِّ النَّفّٰثٰتِ فِى العُقَدِ ﴿٤﴾ وَمِن شَرِّ حاسِدٍ إِذا حَسَدَ ﴿٥﴾
E do mal das trevas (da noite) quando a sua escuridão se espalha, e do mal daqueles que sopram nos nós (na hora de praticar feitiçaria), e do mal do invejoso quando inveja.
Os Ulamá explicam que uma possível razão para esses três males serem mencionados e destacados em particular é que esses três males foram encontrados no incidente que foi a causa da revelação destes dois surates (ou seja, o feitiço que foi feito para Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam).
- O mal da noite escura é mencionado porque a feitiçaria foi feita à noite.
- A maldade daqueles que sopram nos nós é mencionada, pois as pessoas envolvidas na execução do feitiço eram as filhas de Labíd bin Á’ssam, que sopraram nos nós no momento em que fizeram a feitiçaria.
- O mal da inveja é mencionado como a causa principal da prática da bruxaria pelos judeus, a inveja que eles tinham nos seus corações por Raçulullah (sallallahu alaihi wassallam) e por não quererem que sua missão (do Islám) se espalhasse.
Portanto, busca-se protecção especificamente contra estes três tipos de maldades:
- A noite quando a sua escuridão se espalha.
- A maldade daquelas mulheres/almas que sopram nos nós.
- A maldade do invejoso quando inveja.
Destes três males, notamos que o primeiro e o terceiro mal foram mencionados juntamente a uma condição. No caso do primeiro mal, ou seja, o mal da noite, é mencionado com a condição da sua escuridão se espalhar, e no caso do terceiro mal, o mal do invejoso é mencionado com a condição de ele expressar a sua inveja.
No que diz respeito ao segundo mal, notamos que o mesmo não está associado a nenhuma condição. A razão é que o mal da noite está confinado à sua escuridão. Quando a escuridão desaparece com o amanhecer, o mal da noite chega ao fim. O ataque de ladrões e feiticeiros, e os danos causados por diversas criaturas e animais, são habitualmente encontrados à noite. Portanto, quando se busca protecção em Allah Ta’ala contra o mal da noite, todos essas maldades estão incluídas nela.
Da mesma forma, o mal do invejoso só é percebido quando ele manifesta a sua inveja, caso contrário a sua inveja apenas fará com que ele queime por dentro e não afetará aquele de quem ele tem inveja. Assim, busca-se segurança e proteção do invejoso no momento em que ele deseja expressar a sua inveja, pois é nesse momento que ele causa mal aos outros.
No que diz respeito à feitiçaria, elas afectam uma pessoa durante o dia e a noite. Portanto, não há cláusula ou condição associada a esse mal.
Comentando estes versículos, Hafiz Ibn Qayyim (rahmatullahi alaihi) mencionou que a causa de todos os males, sejam físicos ou espirituais, pode ser resumida em duas causas:
1) A verdadeira dor física, calamidade ou infortúnio que a pessoa experimenta.
2) A causa que provoca a dor. No caso da dor física, é a causa física, e no caso da dor espiritual, é a causa espiritual. Por exemplo, kufr, shirk, desobediência a Allah Ta’ala etc. são as causas do retrocesso e prejuízo espiritual.
Este surah, através do versículo مِنۡ شَرِّ مَا خَلَقَ, inclui ambos os tipos das causas dos males e nos ensina a buscar protecção contra as duas formas de maldades.
قُل أَعوذُ بِرَبِّ النّاسِ ﴿١﴾ مَلِكِ النّاسِ ﴿٢﴾ إِلٰهِ النّاسِ ﴿٣﴾ مِن شَرِّ الوَسواسِ الخَنّاسِ ﴿٤﴾ الَّذى يُوَسوِسُ فى صُدورِ النّاسِ ﴿٥﴾ مِنَ الجِنَّةِ وَالنّاسِ ﴿٦﴾
Diga (Ó Muhammad (sallallahu alaihi wasallam)): Eu procuro refúgio no Rabb dos humanos, o Rei dos humanos, o Deus dos humanos, contra o mal do murmurador que recua (quando o nome de Allah Ta’ala é mencionado), aquele que murmura nos corações dos humanos, (quer seja um) dos Jinns ou dos humanos.
No surah anterior (Surah Falaq), o refúgio é procurado principalmente contra males físicos (embora os males espirituais também tenham sido incluídos na generalidade do versículo مِنۡ شَرِّ مَا خَلَقَ – contra o mal de tudo o que Allah Ta’ala criou). Neste surah, busca-se refúgio contra os prejuízos e males espirituais, ou seja, as maldades do Shaitán.
Visto que os danos espirituais são muito piores e maiores do que os danos físicos, o Qur’án Majíd termina com este surah. No caso dos males físicos que afectam uma pessoa, o dano limita-se à sua vida. Assim que ele falece, a difícil provação pela qual estava passando termina. No que diz respeito ao dano espiritual, ele continua e transcende esta vida mundana para a vida do Além. Portanto, entendemos que os males espirituais são mais graves em comparação com os males físicos deste mundo.
Neste surah, a palavra “An-Náss” foi repetida cinco vezes. Geralmente, na fala, se for feita referência a algo que já foi claramente mencionado anteriormente, basta uma mera indicação. Porém, neste versículo, a palavra (An-Náss) é repetida.
Alguns Ulamá explicam que a razão de An-Náss ser repetido cinco vezes é para aludir aos cinco estágios e fases diferentes pelas quais o homem passa durante a sua vida.
No início, ele é uma criança e é quando mais precisa de Allah Ta’ala. Consequentemente, Allah Ta’ala nos ensina que devemos buscar protecção e refúgio Nele. Allah Ta’ala diz:
قُلْ اَعُوۡذُ بِرَبِّ النَّاسِ – Diga, eu procuro refúgio no Rabb da humanidade (Allah Ta’ala).
Rabb refere-se àquele Ser que supervisiona e gere os assuntos de todas as criaturas, auxiliando-as e ajudando-as à medida que se desenvolvem e progridem de fase em fase, cuidando dos seus interesses e necessidades a cada momento. Portanto, no início, quando a criança está na fase de desenvolvimento, a palavra Rabb era a mais adequada a ser usada para explicar a necessidade do ser humano em relação a Allah Ta’ala.
À medida que o ser humano progride, ele se torna um jovem. É nesta fase que ele desenvolve medo pelo governante e pelas autoridades. Assim, através da palavra مَلِكِ النَّاسِ, Allah Ta’ala indica que devemos buscar protecção no verdadeiro Rei e autoridade suprema do homem, ou seja, Allah Ta’ala.
A terceira fase da vida de um ser humano é quando ele atinge a velhice. Geralmente, uma pessoa que se aproxima do fim da vida percebe que precisa de se voltar mais para Allah Ta’ala em adoração e obediência, e assim se esforça mais na rectidão e na adoração de Allah Ta’ala. Portanto, em relação a esta etapa, foi utilizada a palavra اِلٰهِ النَّاسِ. Em outras palavras, o homem deverá voltar-se mais a Allah Ta’ala e buscar refúgio Nele, pois Ele é o Senhor da humanidade, a única Divindade.
Estas três qualidades e atributos de Allah Ta’ala, ou seja, Rabb, Malik e Iláh, indicam a capacidade de protecção.
No que diz respeito à palavra Rabb, em árabe, quando é atribuída a algo, dá o significado de proprietário, por exemplo: رب الدار– o dono da casa e رب العبد – o dono do escravo. Portanto, a palavra “rabb” indica protecção, pois o proprietário geralmente se preocupa com os seus bens e se preocupa em cuidar deles e protegê-los.
A palavra Malik (rei) também indica protecção, pois o rei geralmente se preocupa com o bem-estar e a protecção de seus súditos.
Da mesma forma, a palavra Iláh (Divindade/Deus) indica protecção, pois um Iláh se preocupa com as Suas criaturas. Portanto, quando Allah Ta’ala possui todas estas três qualidades, isto requer que Allah Ta’ala proteja as Suas criaturas, e não haverá protecção maior do que a protecção de Allah Ta’ala.
A quarta vez que a palavra An-Náss é mencionada, ela se refere à condição que o homem passa ao longo da sua vida, onde Shaitán tenta perpetuamente enganá-lo e desencaminhá-lo, incutindo maus pensamentos e sussurros no seu coração. Consequentemente, o homem é ensinado que deve pedir continuamente a protecção e segurança de Allah Ta’ala contra o Shaitán.
A quinta vez que An-Náss é repetido, refere-se aos agentes de Shaitán que ajudam e auxiliam o Shaitán na sua missão de desencaminhar as criaturas. Entre os seus agentes estão outros shayatín e também pessoas más. Como geralmente tem-se observado, a companhia que uma pessoa mantém tem uma grande influência sobre o seu pensamento, mentalidade e comportamento, e mensagens sutis são transmitidas de coração para coração, o que faz com que a visão e a mentalidade de um homem em relação à vida mudem.
Shaitán, o Sussurrador
Neste surah, Allah Ta’ala refere-se ao Shaitán como الْوَسْوَاسِ. A palavra الْوَسْوَاسِ significa literalmente ‘sussurrar’ (que na língua árabe refere-se à raiz da palavra da qual provem todos os verbos). Consequentemente, Allah Ta’ala chama o Shaitán por este nome, usando a palavra raiz, indicando a grande habilidade que ele possui em enganar e desencaminhar o homem através de seu sussurro maligno.
Os Ulamá explicam que no coração espiritual do homem existem dois compartimentos. Num compartimento está um anjo que motiva o homem para o bem. Este encontra-se no lado direito do coração do homem. No lado esquerdo do coração do homem, há um outro compartimento no qual existe um Shaitán que encoraja e atrai o homem para o mal.